terça-feira, 26 de novembro de 2013

Filho és, pai serás

Andando sempre de um lado para o outro, passo a vida de hotel em hotel, e invariavelmente cruzo-me com grupos de gente mais crescida (vulgo idosos) que vêm de longe divertir-se neste país, onde lhes disseram que faz sempre sol.
Enquanto tomo um chá ao serão, ou quando tomo o pequeno-almoço pela manhã, vejo-os alegres, em amena cavaqueira, divertindo-se planeando o dia que começa, ou comentando o dia que acaba; se chego a um fim-de-semana e há música num dos salões, é certo e sabido que os apanho a dançar.
E não consigo evitar de pensar na sorte que estes velhos têm por não terem nascido em Portugal…em Portugal ser velho, a mais das vezes, quer dizer uma pensão de miséria, fome, frio e doença…e quantas vezes abandono e/ou maus tratos.
Lembro-me das idas ao hospital com o meu pai já velhinho, dos olhos do meu pai olhando os outros velhinhos sozinhos, das suas mãos apertadas uma contra a outra, enquanto eu fingia não ver o quanto aquilo o incomodava.
E hoje que o POC escreveu assim, lembro-me mais uma vez desta história:

Nos velhos tempos havia uma terra onde os filhos costumavam levar os pais velhos, que já não podiam trabalhar, para o cimo de um monte, e os deixavam ficavar sozinhos, para morrer à míngua. Certa vez ia um moço do lugar levando o velho pai às costas, para abandoná-lo e chegando ao ponto em que ia deixar o ancião, colocou-o no chão e deu-lhe uma manta para que se abrigasse do frio até a hora da morte.
E o velho perguntou :
- Tens por acaso uma faca contigo?
- Tenho, sim senhor, meu pai. Para que a quer?
-Para que cortes ao meio esta manta que me estás dar. Guarda a outra metade para ti, quando o teu filho te trouxer para este lugar.
O moço ficou pensativo. 
Tomou o pai às costas e voltou com ele para casa, fazendo assim, com que o horrível costume desaparecesse para sempre.

10 comentários:

  1. Há muita tristeza e muita miséria espalhada pelo nosso país. Mas não é menos verdade que há velhos que estão sozinhos porque merecem. A minha avó, os meus sogros, relatam histórias que se passavam antes, com os pais deles e como eles tratavam os filhos, que se fosse comigo, também não iria conseguir ultrapassar e certamente não ia ser na velhice que iria ter pena.
    Digo-te, o meu pai, se chegar a velho, morrerá sozinho.

    ResponderEliminar
  2. :) E bonita história... Respect velhos.

    ResponderEliminar
  3. Eu costumo contar essa história N vezes a muita gente. Cá em casa já a sabem de cor e reviram os olhos quando eu começo com a lengalenga, Na Minha Guerra, lá vão ouvindo no género entra a 100 e sai a 200... espero sinceramente que retenham alguma coisa porque a minha tristeza é que não vejo futuro digno para os velhos, nem um monte com um manta, só trabalho, trabalho até morrer.

    ResponderEliminar
  4. A solidão na velhice, agora agravada 'pela austeridade e pela miséria a que por causa disso alguns já estão sujeitos é uma das maiores vergonhas deste país...! Sei bem do que falas...das muitas visitas que infelizmente faço ao IPO, acompanhando o meu marido, fica-me sempre o amargo de boca de ver tantos tão mal e tão sozinhos...mal podendo por vezes andar...entubados alguns...mas heroicamente sós lutando pela vida apesar de tudo...ultimamente tenho visto menos por lá ...há agora muitas faltas às consulta se tratamentos..os que vinham sós..agora também não têm dinheiro para as viagens que faziam às vezes de longe...!!! E assim vão os portugueses mais velhos e mais carenciados que amanhã poderemos ser nós!
    Bjs
    Maria

    ResponderEliminar
  5. Esta história é uma pérola. Muito bom mesmo!

    ResponderEliminar
  6. Oki depois aviso-te das Bolinhas de Natal :)
    Obrigada por ajudares! Bj

    ResponderEliminar
  7. O que mais me deixa apreensiva è como serà a minha velhice.

    ResponderEliminar
  8. Faz-me pensar muito sobre o que significa envelhecer e a injustica da solidao. A velhice ate devia ser uma optima fase da vida, nao e? Em que temos tempo para desfrutar toda o conhecimento e experiencia que a vida nos trouxe. Mas e tao diferente...

    ResponderEliminar